Uma importante confissão



Como lhe disse, a humanidade não se divide em dois.
 
Você pensa que sou um homem, caro leitor, e o meu nome é Orlando I.

Tenho nome de rei, mas sou uma mulher.
 
Poderemos ser apenas o insignificante espinho quase invisível entre tantos desta vasta coroa que oprime e tortura a nossa imensa humanidade crucificada, mas, neste mundo, por mais que sejamos o sangue ou o espinho, a rapariga ou o homem, o forte ou o fraco, o nativo ou o colono, o explorador ou o explorado, o capital ou o trabalho, neste mundo, por mais que habitemos o lado da abundância ou o lado da miséria, o lado da liberdade ou o lado da opressão, o lado da paz ou o lado da tortura, o lado da saciedade ou o lado da fome, neste mundo haveremos de ser sempre a outra face de uma mesma dor, a respiração ou o silêncio de um mesmo grito e o breve esplendor de uma mesma morte.

«Neste mundo», porque para já não temos outro.

E é por isso que eu, Orlando I, vos digo que sou uma mulher.

Ou melhor, uma rapariga.

Na verdade, meu caro leitor não-humano, eu, Orlando I, não sou mais do que uma menina.