Raif Badawi

 
 
Foi no início de Janeiro deste ano de 2015 que milhares de fiéis se concentraram à porta da mesquita de al-Jafali, em Jeddah, na Arábia Saudita, para assistir à aplicação das primeiras cinquenta chicotadas ao blogger Raif Badawi, enquanto gritavam «Allahu Akbar» - «Deus é grande».
 
Badawi foi condenado porque, segundo os tribunais sauditas, criou e alimentou um blogue - o Liberais Sauditas Livres - que «violou os valores islâmicos e propagou o pensamento liberal.»

A Arábia Saudita é uma monarquia absoluta teocrática governada pelo Rei Salman e pela família real que vem da Casa de Saud. O Rei rege-se pela Sharia, a Lei Islâmica que se condensa no Alcorão e nas Sunnas e que foi declarada como Constituição, não tendo sido entretanto redigida nenhuma outra Constituição para o país.

A Arábia Saudita é a segunda maior reserva de petróleo do mundo e a sexta maior reserva de gás natural. É um país riquíssimo, ainda que sem água doce. Tanto para a agricultura como para as pessoas é a água do mar que é utilizada, depois de dessalinizada.

Apesar de ser o décimo nono país com o rendimento per capita mais elevado do mundo, a Arábia Saudita é o único país em que as mulheres são proibidas de conduzir. A discriminação das mulheres é de tal ordem que elas na verdade não têm direito a sair à rua sozinhas, nem direito a herança, nem «voz legal», ou seja, têm sempre de ser representadas, como se fossem menores, pelo seu «guardião» masculino, pelo pai, pelo irmão, pelo marido ou por um filho, o que dá azo a índices dramáticos de violência. Ou a casos como os da menina que foi violada numa festa pelos amigos do irmão, na sua própria casa e que, obrigada a dar à luz em consequência de uma gravidez causada pelo estupro, foi depois apedrejada até à morte no meio da rua. (1)

Apesar de membro da ONU, a Arábia Saudita não reconhece a Declaração dos Direitos Humanos.

No seu próprio país, Raif Badawi, ao escrever frases como «os Estados assentes na religião confinam os seus povos a um círculo de fé e de medo», foi condenado a mil chicotadas em hasta pública e a dez anos de prisão.

Mas talvez o mais chocante seja que em Outubro deste mesmo ano Faisal bin Hassan Trad tenha sido nomeado, como embaixador da Arábia Saudita, em Genebra, para o comando do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (UNHRC - United Nations Human Rights Council), que é composto por quarenta e sete membros com o fim de promover e proteger os direitos humanos em todo o mundo.

O pequeno bicho humano vagueia ao sabor da sorte e dos países, dos reis, da miséria dos fracos ou da violência dos fortes. E a humanidade no seu todo continua a primar de tal modo pela incoerência que podemos talvez orgulhar-nos de ser a espécie mais indescritível de todo o cosmos.
 





(1) Esta história foi retirada do livro «A Princesa Sultana».