Síria

 
Desde 2011 que as luzes se apagam na Síria que passa a negro vista do céu.

Na Universidade de Wuhan, na China, Xi Li observou através de fotografias por satélite como a devastação da guerra extinguiu as luzes entre Março de 2011 e Fevereiro de 2015, uma escuridão que apenas se equipara ao rasto da escuridão equivalente que deixou atrás de si o genocídio de Ruanda.

As crianças morrem de frio nas tendas e nas barracas com as temperaturas negativas do Inverno, e param as escolas, as casas, os hospitais, as fábricas, as padarias...

Os números estimam mais de duzentos mil mortos, cinco milhões de deslocados e quatro milhões de refugiados. Mas eu pergunto-lhe, caro leitor - como podemos sequer imaginar a dimensão de tais números? Onde está a medida da dor, da loucura, da violação da justiça, da paz e da inocência? Onde está a régua impossível que possa medir o desespero ou o sem-fundo de uma tal escuridão?

Começou como mais um dos protestos da Primavera Árabe, dessa vez contra Bashar al-Assad, num país que se mantinha em estado de emergência há mais de trinta anos e depois de serem presos e torturados os adolescentes que tinham escrito no muro da escola algumas palavras de revolta contra o regime, na cidade de Deraa.

Transformou-se então na batalha sangrenta que confronta hoje a maioria sunita com a minoria xiita alauíta do presidente, envolvendo os países vizinhos e as grandes potências ocidentais.

Foi como se tivessem acendido um rastilho.

De um lado estão o Irão e a Rússia que apoiam com amplos recursos militares o regime do Presidente e do outro lado estão a Turquia, a Arábia Saudita, o Catar, o Reino Unido, os EUA e a França, apoiando a oposição sunita.

Xiitas e sunitas distinguem-se especialmente pela interpretação que fazem dos textos sagrados do Alcorão. Os primeiros, mais conservadores, os segundos, mais progressistas. E ainda pela disputa que se originou em 632 d.C., pelo direito da sucessão legítima do profeta Maomé. 

Extraordinário, o que pode dividir os homens.
 
Nesta terra do deserto e do caos é que pôde avançar o Estado Islâmico, um grupo sunita radical, conquistando inúmeras armas e armamento pesado, importantes campos de produção petrolífera, centrais eléctricas, incríveis quantidades de mantimentos e terras e, de cidade em cidade, aniquilando os povos, as ruínas milenares, queimando os museus e violando as raparigas.

Quem vence é a crueldade?
 
Nem as estrelas desaparecem ao desbarato com a nossa dor, nem estoiram as montanhas com a nossa revolta.
 
Alguma vez o nosso desejo foi capaz de entrar pelas chaminés das casas para saquear o coração de alguém que se esqueceu de nos amar?
 
Entre a nossa intensidade e o mundo há um abismo - a impotência.