Primeiro Intervalo


 
Façamos, neste momento, o ponto da situação.
 
Como decerto se recordará, comecei logo no início deste blogue por apelar ao seu sentido crítico, caro leitor.
 
Tentei demonstrar-lhe, sem lhe ocultar as fragilidades evidentes de uma tal demonstração, como a questão de sabermos porque não somos contactados por extraterrestres é, de facto, pertinente.
 
Após breves mas perspicazes incursões científicas, arrasado com a incomensurabilidade do universo conhecido e especulado, propus-lhe então que olhássemos estritamente para o nosso planeta e, em particular, para o mais incompreensível e disseminado mito da era moderna do capitalismo neoliberal - o do crescimento infinito.
 
Foi neste contexto que lhe apresentei Charles Chaplin comendo serpentinas como se fossem esparguete.
 
Foi também a partir daí, meu caro leitor, humano, não-humano, ou extraterrestre, que iniciei o périplo para o qual não sei ainda se terei as forças necessárias. Questiono-me neste momento se serei realmente humano, porque não sei já de que lado é que estou, se do lado humano, se do não-humano.
 
Falei-lhe da violação em massa das mulheres na República Democrática do Congo, como estratégia de guerra, em luta pelos diamantes. Da carnificina em nome de Deus, em pleno século XXI, perpetrada pelo Estado Islâmico. Do casamento ou da violação legal das meninas no Novo Sudão. Da lapidação pública e dos crimes de honra no Paquistão, em que as raparigas tanta vezes são mortas pelos tios, pai e irmãos. Do tráfico humano no mercado negro global, por um lado, e da exploração legal mas infame do trabalho, por outro. E das crianças que matam.
 
Confessei-lhe, caro leitor, como, apesar deste nome de rei, eu, Orlando I, não sou mais que uma menina.
 
De olhos bem abertos. Continuemos.
 
Que nos sejam facultadas forças para prosseguir.